23 março, 2010

Análise da conjuntura política-social no Brasil

O sociólogo Rudá Ricci mapeou algumas tendências societárias no Brasil atual. Reproduzo aqui algumas de suas colocações em entrevista recente a uma rádio mineira, por motivos apenas de valor sociológico, pois é um estudioso que tem experiência vivida do que está falando, não tendo apenas conhecimento livresco:

1ª Estamos vivenciando a maior crise interna que o PSDB já sofreu, desde sua fundação. Provavelmente, se José Serra perder a eleição, Aécio Neves irá despontar como a principal liderança desse partido.

2ª Teoricamente, Dilma Roussef faz parte do bloco lulista. Mas ela não tem o perfil de uma pessoa que se deixa ser conduzida como marionete. Ela vem das águas do PDT gaúcho, brizolista e centralizador. Pode, no futuro, oferecer problemas para o próprio Lula. Irá, pelo menos, criar algum tipo de resistência a liderança absoluta de Lula.

3ª Qual é a equipe que Dilma está montando? O da primeira gestão do governo Lula: José Dirceu, Fernando Pimentel, etc. Pessoas que não se construíram politicamente como ela, no PT, a partir da mobilização de massas. Ao contrário de Lula, que se forjou nas lutas sociais. Então esse "staff" não tem a ver com as lutas sociais, com ONG's, lideranças da Igreja Católica ligada a Teologia da Libertação. Dilma deverá cristalizar a mudança no perfil de projeto político no PT. Antes eram lideranças de base e, hoje, são técnicos da política.

4ª Segundo Rudá, com a vitória de Dilma, ocorrerá um confronto interno entre o lulismo e o PT. Dilma operaria uma transição mais forte em prol dos setores técnico-burocráticos do partido.
Isso em razão de representar um clássico modelo de esquerda governar como era no antigo "Partidão" (PCB). Esse modelo é centralizador, meramente técnico, que negocia diretamente com atores políticos que interferem na agenda nacional.

5ª O lugar da política, que nos anos 80, se lutava para que fosse também nos bairros e nos locais de trabalho, acabam. Essa era dos movimentos sociais termina de uma vez, não importa quem vença a eleição. Os trabalhadores e as donas de casa voltam para suas casas e locais de trabalho. Um dos motivos para isso está no fato da relação de proximidade do presidente com a população. O lulismo se antecipa ao desejo e estabelece uma relação de tutela.

6ª A estrutura colossal do governo lulista: O lulismo se apoia em três grandes vertentes.
O primeiro bloco diz respeito ao PAC e a consequente aproximação com o grande capital brasileiro. 90% das multinacionais brasileiras recebem financiamento do BNDS.
O segundo bloco está no diálogo direto com os setores mais pobres da população e com a nova classe média, através do crédito consignado, aumento do salário mínimo e do bolsa família (e cotas).
O terceiro bloco é formado junto aos demais partidos. O atual governo montou uma estrutura de coalisão presidencialista. Os demais partidos perderam a independência e não apresentam nenhuma alternativa como projeto nacional.

7ª O DEM praticamente não existe mais como partido e oposição.

8ª Existe uma descrença da população em relação as instituições. Os movimentos sociais precisam recuperar a autonomia. As redes sociais, grande parte dos movimentos sociais e ONG's se partidarizaram e viraram base de campanha eleitoral, mesmo esses não os representando de forma participativa. Já vi debates na internet que são totalmente pautados como se fossem partidas de futebol.

9ª Existe 30 mil conselhos (saúde, educação, etc.) no país. Estão absolutamente desarticulados pois não pautam as reuniões com o governo.

10ª O conservadorismo da sociedade civil: em recente livro chamado "A classe média brasileira", organizado por Bolivar Lamounier e Amaury de Souza, é apresentado os dados de que 63% dos membros da classe D e E nunca participaram de organização social, já na classe C esse mesmo indicador fica com 56%. A família é o único agrupamento social confiável (80%). Nem amigos aparecem como confiáveis (40%). Segundo a pesquisa, a única instituição citada como digna de confiança é a igreja (66%). Depois, a televisão (26%).

11ª Por fim, sua tese é de que o brasileiro não é solidário, porque é desconfiado e se isola na família. Uma outra pesquisa revelou que, apesar da maioria se declarar contra o aborto, confessam a existência de pelo menos um caso de aborto na família.

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